Manipulação intelectual
Raras são as derrotas do Sporting em que os responsáveis deste clube, nomeadamente na pessoa do seu treinador, perdem a oportunidade para exibir a tremenda falta de fair-play que começa por lá a ser apanágio.
Desta vez, tudo começou com a nomeação de Duarte Gomes, árbitro com o qual os leões mantêm um diferendo por um desaguizado que o mesmo protagonizou com o treinador de guarda-redes leonino. Pois bem, dizem eles que tal nomeação representa uma enorme provocação para o seu clube. Presumo que diriam o mesmo se o escolhido fosse João Ferreira, ou Lucílio Baptista, ou Soares Dias, ou Pedro Proença, ou Jorge Sousa. Conclusão, a maioria dos árbitros não serve para arbitrar jogos que envolvam o Sporting e, no último encontro em particular, o desejável seria mesmo que um qualquer Elmano Santos, Carlos Xistra, ou Bruno Paixão fosse o designado pela Comissão de Arbitragem da Liga, presidida por Vítor Pereira, sócio cinquentenário do clube de Alvalade.
Findo o jogo, e como já seria de esperar tendo em conta o resultado desfavorável, a histeria tomou conta das hostes leoninas. Paulo Bento, encabeçando a lista de "vítimas", não perdeu tempo a fazer um sumatório de afirmações inconsequentes, mal educadas e sem o menor encadeamento lógico. A este juntaram-se o habitual rol de comentadores verdes e brancos, sempre prontos para defender o seu líder.
Acontece que, e depois de tudo ser bem esmiuçado pelas imagens televisivas, a única coisa que pode ser alegada, como sendo desfavorável ao Sporting, é a não amostragem do segundo cartão amarelo a Raul Meireles. Tudo o resto é subjectivíssimo, e já estou a ser muito amável ao usar esta expressão. A falta que dá origem ao golo do Porto, no limite dos limites, é pelo menos duvidosa, merecendo o árbitro o benefício de causa. Miguel Veloso vê, e muitíssimo bem, o segundo amarelo e a primeira cartolina que lhe é exibida também é aceitável. Polga comete grande penalidade inequívoca. No meio disto, Liedson passa o jogo inteiro a refilar e nem um cartão para amostra, mas isto também é irrelevante.
Perante tudo isto, haverá alguém de boa fé que poderá culpabilizar o árbitro pela atribuição do vencedor final? Em consciência, claro que não. Ainda por cima quando da única jogada em que o árbitro ajuizou mal, não resultaria nenhum golo, nem sequer um penalty para nenhuma das partes. Levaria, isso sim, à saída de campo de um dos piores jogadores do encontro, agora daí a afirmar que o resultado seria outro, vai uma distância considerável.
Então porquê tanta celeuma alimentada pelo treinador leonino antes, durante e após o jogo? Simples, para desviar as atenções de uma forma vil e desordeira. A isto chama-se manipulação intelectual. A expressão, associada ao mundo futebolístico, foi trazida pelo actual treinador do Inter e, neste caso, encaixa na perfeição. Porém esta manipulação é mais interna do que externa. Paulo Bento está a cumprir a sua quinta época como técnico principal à frente de um clube grande e sem um único título de campeão no bolso. Alguns adeptos - poucos - acham isso intolerável, outros há - a maioria - que se preferem refugiar neste discurso impulsivo e grosseiro do seu treinador para não terem de constatar a realidade.
Quem ler este post ainda vai pensar que eu sou algum fiel defensor do senhor Duarte Gomes. Não se trata disso, muito pelo contrário. Considero que este árbitro é dos piores que este país tem o que, tendo em conta a péssima qualidade dos seus colegas de apito, é dizer muito. Só que, nesta situação concreta, as ondas que se levantaram à volta da sua última arbitragem roçam um ridículo inusitado. Um ridículo que só tem paralelo no jogo da taça que opôs as mesmas equipas na época passada e que foi arbitrado pelo inefável Bruno Paixão, esse bom samaritano, sempre tão amigo do FC Porto. Também nesse jogo o Sporting saiu derrotado e igualmente revoltado com a arbitragem, mesmo tendo sido beneficiado descaradamente.
Convenhamos que, para quem está tão habituado ao sabor da derrota, os sportinguistas podiam encarar os desaires com um pouco mais de serenidade, até porque os fiscais de linha não podem andar sempre com comichão no olho.